Marine Le Pen e a ascensão da "extrema-direita de rosto humano"
Marine Le Pen tinha apenas oito anos quando, em 1976, o edifício onde vivia com os pais e as irmãs mais velhas, Yann e Marie Caroline, foi alvo de um atentado bombista. Nenhum membro da família Le Pen foi apanhado pela explosão, mas seis vizinhos ficaram feridos e 12 apartamentos foram destruídos.
Trabalho originalmente publicado no "Jornal Económico", na edição de 14 de junho de 2024.
Até hoje desconhece-se a autoria do atentado, mas as autoridades suspeitaram de imediato que o alvo era Jean-Marie Le Pen, o pai de Marine. A experiência foi marcante para esta última, tendo-se apercebido, subitamente, que o pai tinha inimigos dispostos a tudo para o eliminar. Muito mudou então para a pequena Marine. Na escola, começou a ouvir comentários depreciativos sobre Jean Marie. E algumas crianças foram aconselhadas pelos pais a deixarem de ser suas amigas, por ser filha de um "perigoso" líder da extrema-direita.
Quatro anos antes, em 1972, Jean-Marie foi um dos fundadores da Frente Nacional, um partido nacionalista, anti-imigração, xenófobo, reacionário, conservador nos costumes, contrário à hegemonia económica e cultural norte-americana e profundamente anti-comunista.
O partido rapidamente atraiu uma pequena coorte de saudosistas da Argélia francesa, antigos colaboracionistas de Vichy, velhos monárquicos da Action Française e ex-pujadistas (o próprio Le Pen começara a sua vida política neste movimento populista) que não se reviam na França saída do Maio de 68.
Rejeitavam esta França marcada pela liberdade de costumes, pelo reconhecimento dos direitos das mulheres, pela integração europeia, a imigração em massa, a industrialização e o triunfo de uma sociedade de consumo muito inspirada no modelo dos Estados Unidos.
Le Pen e o seu partido rapidamente se tornaram a bête noire da república, pelos seus comentários extremistas, xenófobos e racistas, pela sua apologia do regime colaboracionista de Vichy (“Resistir em Londres era mais fácil”, argumentou, numa comparação sobre quem fora mais corajoso durante a Ocupação, se Pétain ou De Gaulle) e pela menorização do Holocausto, que por mais de uma vez considerou ser “um detalhe na história da Segunda Guerra Mundial”.
Desde que, em 2011, ascendeu à liderança da Frente Nacional, hoje chamada Reagrupamento Nacional (RN), Marine Le Pen tem feito um esforço para suavizar e “des-demonizar” a imagem do movimento, chegando ao ponto de, como veremos adiante, ter expulsado o pai na sequência de (mais uma) declaração polémica que o patriarca fez em 2015. Marine cortou com as raízes anti-semitas e pétainistas da Frente Nacional, abandonou as bandeiras do partido em temas como o aborto ou as uniões gay, declarou-se uma feminista que não está em “guerra com os homens” e tem procurado convencer o eleitorado francês de que o RN não é um partido de extrema-direita. “Não vejo nada nas nossas propostas que possa ser considerado extremista”, disse em tempos a respeito de bandeiras eleitorais que tanto apelam à extrema-direita (em temas como imigração, segurança e Europa) como à extrema-esquerda (intervenção do Estado na economia, protecionismo, saída da NATO e entendimento com a Rússia).
Nigel Farage, campeão do Brexit e insuspeito de moderação política, fez uma boa descrição do programa de Le Pen, numa entrevista a uma estação de rádio britânica, em 2016. “Nunca disse uma má palavra a respeito de Marine Le Pen. "Mas também nunca disse uma boa palavra a respeito do partido dela”, disse Farage nessa entrevista, ainda antes do sucesso da sua cruzada populista em prol do Brexit. Instado a explicar o sentido desta frase, Farage respondeu que reconhece que Marine Le Pen coloca em primeiro lugar a soberania da França (tal como ele em relação ao Reino Unido), mas que as “suas ideias económicas são muito, muito socialistas”.

Este esforço para apelar a eleitorados com backgrounds muito distintos, desde os votantes tradicionais do PCF aos nacionalistas hardcore, juntamente com um longo processo de “normalização” da sua imagem pública, rendeu ao RN enormes dividendos eleitorais na última década. O facto de ser considerada uma figura mais empática e “humana” que o pai também ajudou a esta transformação do partido. Se Jean-Marie é muitas vezes tratado por “monsieur Le Pen”, Marine é identificada frequentemente, em França, apenas como “Marine” e não como “madame Le Pen”, exceto por adversários como Emmanuel Macron.
Com tudo isto, Marine lidera com larga vantagem as sondagens para as presidenciais de 2027 e o seu partido poderá ser o mais votado nas legislativas antecipadas que Macron convocou na sequência da vitória estrondosa dos extremistas nas eleições europeias.
Marine Le Pen está, por isso, em vias de conseguir aquilo que o pai, homem que quase toda a gente amava odiar, jamais logrou alcançar. Mas aparências e spin à parte, quem é verdadeiramente Marine Le Pen neste ano de 2024 e até que ponto é diferente do pai nos temas decisivos para a democracia francesa e para a UE?
Bernard Henry-Lévy disse em tempos que Marine é a extrema-direita com “rosto humano”. Porém, talvez seja mais do que isso. É a extrema-direita que tem realmente hipóteses de ser bem-sucedida na conquista do poder, constituindo assim uma ameaça muito mais séria ao statu quo político e económico do que o seu pai ou outros líderes extremistas alguma vez foram.
O “homem de ação” que, por três vezes, chegou atrasado à guerra
Para compreender os dois Le Pen que protagonizam esta história e perceber o que os une e aquilo que os separa, temos de recuar às origens do clã.
Nascido em 1928, em Trinité-sur-Mer, na Bretanha, Jean-Marie Le Pen é filho de um pescador e de uma costureira. Conheceu a adversidade desde muito novo, tendo ficado órfão de pai em 1942, quando o barco deste foi afundado por uma mina alemã durante a guerra.
Aos 13 anos, começou a trabalhar num transatlântico, ainda em plena guerra. Já se via a si mesmo como um homem de ação que tinha uma missão a cumprir e, em 1944, tentou alistar-se nas Forças Francesas do Interior, para combater os alemães. No entanto, foi impedido de o fazer por um líder da Resistência ligado ao Partido Comunista. O motivo para a rejeição foi a idade de Jean-Marie, uma vez que tinha apenas 16 anos.
A guerra terminou em 1945 e, nos anos seguintes, Jean-Marie estudou num colégio de jesuítas e formou-se em Direito na Universidade de Paris. Nesta época, ficou conhecido pelo seu papel como dirigente estudantil e por participar em movimentos de direita que ocupavam uma boa parte do tempo em lutas de rua com os seus rivais comunistas, a quem chamavam “cocos”.
Para Le Pen, “quebrar cocos” nestas zaragatas era uma atividade divertida, mas o jovem bretão ansiava por ação de verdade e, em 1954, alistou-se na Legião Estrangeira para poder combater como paraquedista na Indochina. Porém, mais uma vez chegou tarde à guerra, tendo aterrado em Saigão já depois da derrota francesa em Dien Bien Phu.
Foi de seguida despachado para o Suez, mas chegou igualmente tarde demais para poder participar em alguma ação contra as tropas de Nasser. Parecia que a glória militar lhe escapava por entre os dedos, à medida que os políticos da frágil Quarta República assinavam sucessivos armistícios com inimigos de França.
A entrada na vida militar não tirou a Jean-Marie o gosto pela política, que experimentara pela como dirigente estudantil. Juntou-se ao movimento pujadista e, em 1956, aos 27 anos, foi eleito deputado. Iniciou assim uma carreira política que se estenderia por seis décadas, embora com interrupções, a primeira das quais para poder regressar ao serviço militar durante a Guerra da Argélia, em 1957, com uma breve comissão como oficial de inteligência, durante a qual se diz que terá participado em atos de tortura, acusação que sempre negou.
Com os acordos de Évian, em 1962, que os defensores da Argélia francesa nunca perdoaram a De Gaulle, a viragem de Le Pen rumo à extrema-direita foi definitiva e, pouco a pouco, o ex-paraquedista tornou-se uma figura destacada nos círculos nacionalistas de antigos combatentes. Afirmou-se gradualmente nesse bas-fond que juntava pessoas de várias proveniências ideológicas e passados mais ou menos duvidosos, e, quando a Frente Nacional nasceu, em 1972, foi escolhido para liderar o partido por ser considerado um líder relativamente moderado e capaz de apelar a um eleitorado mais vasto. O que nos deve fazer pensar sobre o quão extremistas seriam os outros dirigentes.

Porém, o verdadeiro golpe de sorte de Le Pen deu-se em 1976, aos 48 anos, quando um dos seus apoiantes, o milionário Hubert Lambert, herdeiro de um império na indústria dos cimentos, lhe deixou em testamento uma fortuna avaliada em 30 milhões de francos (cerca de 19 milhões de euros, em valores atuais). Da noite para o dia, Le Pen tornou-se um homem muito rico, fazendo questão de dizer aos outros dirigentes da FN que se tratava de um legado dirigido a si, em termos pessoais, e não ao partido. Para Le Pen, a independência financeira permitida pela herança Lambert foi crucial para conseguir que a FN crescesse e para que ele próprio conseguisse permanecer como um protagonista da política francesa durante os 40 anos que se seguiram.
Sem essa herança milionária, provavelmente o nome de Jean-Marie Le Pen seria hoje uma mera entrada numa qualquer listagem de obscuras figuras da extrema-direita francesa do século passado. E a própria FN não teria sobrevivido. “Sem Lambert, não haveria FN. Sem Le Pen, não haveria Lambert”, diria mais tarde um dos colaboradores mais próximos do líder, Lorrain de Saint Affrique.
Os primeiros resultados do partido foram modestos (0,5% nas legislativas de 1973), mas de eleição em eleição a Frente Nacional ganhou relevância, capitalizando o descontentamento popular com as consequências do choque petrolífero de 1973, o aumento da criminalidade, a subida do desemprego ou os efeitos da globalização e da desindustrialização do país a partir dos anos 90. De votação em votação, a FN foi elegendo cada vez mais deputados para a Assembleia Nacional e para o Parlamento Europeu, num processo de crescimento que culminou na passagem de Le Pen à segunda volta das presidenciais de 2002, contra todas as expectativas da “bolha” política e mediática parisiense.
O 21 de abril desse ano constituiu um duro despertar da sociedade francesa para a ascensão da extrema-direita e ainda hoje é invocado como o dia em que Le Pen e a Frente Nacional se tornaram uma ameaça credível à ordem vigente, ao ponto de o próprio PS (cujo candidato, Lionel Jospin, ficou em terceiro lugar na primeira volta), ter apelado ao voto no incumbente Jacques Chirac, que acabaria por ser reeleito para um segundo mandato no Eliseu, com 82% dos votos.
A história de um pai e da sua filha
A jovem Marine Le Pen cresceu na sombra deste pai larger than life, amado por muitos e odiado por outros mais (uma sondagem da Ipsos, em 2002, dizia que 22% dos inquiridos tinha uma boa ou muito boa opinião de Jean-Marie, enquanto 74% tinham uma visão negativa ou muito negativa). Um pai provocador e polémico, que adorava causar celeuma e dizer coisas que envergonhariam a maior parte das pessoas civilizadas. Para Marine, o pai era uma figura que lhe servia de modelo, mas que, ao mesmo tempo, dizia barbaridades que, muitos anos mais tarde, ela renegaria publicamente.
Entretanto, a vida privada de Jean-Marie era tão truculenta como a sua carreira política. Em 1984, após 24 anos de um casamento marcado pela tensão causada pelas diferenças políticas, a mãe de Marine, Pierrette, deixou o marido e o lar, no que foi um choque para a filha, que se sentiu abandonada. Mais tarde, Marine contou que “a dor mais horrível, cruel e devastadora” foi ter descoberto, aos 16 anos, que a mãe não a amava.
O divórcio foi decretado em 1987 e, nesse ano, Pierrete exigiu o pagamento de uma pensão de alimentos ao ex-marido. Questionado sobre o assunto numa entrevista à edição francesa da “Playboy”, Jean-Marie afirmou que se a ex-mulher queria dinheiro podia trabalhar a fazer limpezas. A resposta de Pierrete ao desaforo não se fez esperar. A ex-mulher de Le Pen aceitou uma proposta bem remunerada da “Playboy” para posar semi-nua para a revista, fazendo o que parecia ser trabalho de limpeza. Essa edição da revista esgotou em pouco tempo, vendendo mais de 100 mil exemplares.
Para Marine, foi mais um rude golpe na relação com Pierrete. “Hoje, depois destas fotos, não a podemos considerar mais nossa mãe. É pior do que seria perdê-la, uma mãe faz parte de um jardim secreto, não de uma lixeira pública”, terá dito.
Os anos formativos de Marine Le Pen foram assim passados numa família que se poderia considerar disfuncional, aprendendo desde muito cedo a desenvolver uma “carapaça” protetora. Formou-se em Direito e, após exercer a advocacia durante seis anos (trabalhando inclusive como defensora oficiosa), em 1998 entrou para os serviços jurídicos da Frente Nacional e a partir daí desempenhou diversos cargos no partido, assumindo gradualmente cada vez mais responsabilidades. Casou duas vezes com homens ligados ao partido, tendo três filhos do primeiro marido, mas a relação mais longa que manteve foi com outro dirigente da Frente Nacional, Louis Alliot, com quem viveu em união de facto entre 2009 e 2019.
Do pai, para além do rosto amplo e das feições célticas, Marine Le Pen terá herdado sobretudo a personalidade forte e a resiliência. Pouco a pouco fez o seu caminho, degrau a degrau, superando figuras como Bruno Gollnisch e outros que aspiravam à sucessão. Fez o trabalho de casa e, quando se candidatou à liderança da Frente Nacional, em 2010/11, teve o apoio do pai e de outras personalidades de relevo, derrotando o rival Gollnisch. Na altura, Marine disse logo ao que vinha: transformar a FN “num grande partido nacional que vá ao encontro não só do eleitorado da direita mas de todo o povo francês”.
O preço do sucesso: ‘matar’ a figura do pai
O processo de normalização da FN decorreu ao longo dos anos seguintes, com a suavização de várias bandeiras do partido, um rebranding e um corte radical com uma parte do seu passado, ao ponto de Marine se dizer hoje a continuadora do legado de Charles De Gaulle. Por ironia do destino, um partido que foi fundado, em parte, por inimigos do general, apresenta-se hoje ao mundo como seu herdeiro, no que constitui uma tentativa óbvia de conquistar o eleitorado da direita moderada que até recentemente votava em figuras como Chirac e Sarkozy.
Porém, Marine Le Pen manteve a linha dura em temas como a imigração, o euroceticismo, o nacionalismo, a pertença à NATO e a imposição de medidas protecionistas, apontando baterias à globalização e aos efeitos negativos que diz ter em França e nos povos de todo o mundo.
Ainda assim deu-se uma metamorfose, durante a qual Marine teve de ‘matar’ o pai. Tal como Bruno Mégret já defendera nos anos 90, a figura de Jean-Marie Le Pen impedia o partido de crescer, devido às suas posições extremistas. A longevidade do presidente honorário vitalício do partido representava um embaraço crescente para a sua filha. Em 2015, Jean-Marie voltou a afirmar publicamente que o Holocausto foi apenas um “detalhe” histórico, minimizando o genocídio que vitimou milhões de pessoas.
Marine reagiu com uma declaração em que salientava que o Holocausto foi uma “barbaridade” e avançou com a expulsão de Jean-Marie, para que este não pudesse voltar a falar em nome do partido. Foi uma espécie de sacrifício ritual do pai, numa altura em que a filha já tinha demonstrado ser capaz de levar o barco por diante. Mas o velho líder não lhe facilitou a vida, tendo o assunto chegado aos tribunais. “Marine Le Pen talvez me queira morto, é possível, mas não vai contar com a minha cooperação”, disse o patriarca durante a disputa pública com a filha.
Nos anos que se seguiram, a ascensão fulgurante de Marine e do seu partido teve como contraponto o desaparecimento gradual do pai, que em 2016 formou o movimento Comités Jeanne (evocando Joana D’Arc), que alguns analistas apelidaram de “extrema-direita da extrema-direita”. Este partido não teve sucesso e, com o declínio da saúde física e mental de Le Pen, praticamente desapareceu. Em abril último, Jean-Marie, agora com 95 anos, foi colocado sob a tutela legal das filhas, devido ao declínio das suas faculdades.
Uma nova geração no RN
No RN, Marine Le Pen deu continuidade à dinastia familiar e, em 2022, passou a presidência do partido a um jovem de 26 anos, Jordan Berdella, companheiro da sua sobrinha Nolwenn, filha da irmã Marie Caroline. Mas Marine ainda é o poder por detrás do trono, enquanto líder da bancada parlamentar do RN e favorita às presidenciais de 2027.
Em todo o caso, a passagem de testemunho a uma pessoa tão jovem representa uma mudança geracional e mais um corte com o argumentário da FN de outros tempos. Quando Bardella nasceu, em 1995, a Segunda Guerra Mundial já tinha terminado há 50 anos. A Argélia era independente há 33 e Phillipe Pétain é tão vivo na memória da sua geração como Luís XIV, Napoleão ou Clemenceau.
Representa um sinal dos tempos, tal como a própria vida privada de Marine e das irmãs, que tiveram vários maridos e companheiros, contrastando com o ideário pró-família tradicional de que a primitiva FN se dizia defensora.
Bardella tem, de resto, boas possibilidades de se tornar o próximo primeiro-ministro francês, sucedendo a outro jovem, Gabriel Attal, que aos 35 anos foi nomeado por Macron para a liderança do executivo, numa escolha que terá visado responder à ascensão do novo líder do RN.
As últimas sondagens colocam o partido de Le Pen à frente nas sondagens para as legislativas, cuja primeira ronda está marcada para 30 de junho. De acordo com uma sondagem da Toluna Harris Interactive, divulgada esta semana, o RN conseguirá entre 235 e 265 lugares no parlamento, face aos atuais 88. Já o partido de Macron perderá metade dos atuais mandatos, passando para 125 a 155, enquanto a esquerda ficará, no seu conjunto, com entre 115 a 145.
Para ter maioria, o RN precisa de 289 deputados, o que poderá conseguir com uma aliança com Os Republicanos, o partido gaullista de Chirac e Sarkozy, hoje uma sombra do que foi. Os Republicanos estão divididos, mas o seu líder, Éric Ciotti, afirmou que está disponível para esse entendimento, numa viragem histórica face ao cordão sanitário que existiu durante décadas. Porém, este anúncio está a ser muito contestado entre os Republicanos e está em curso uma revolta interna que visa derrubar e expulsar Éric Ciotti.
O fim da União Europeia tal como a conhecemos?
A eventual vitória do RN nas legislativas e a provável eleição de Le Pen como presidente, em 2027, terão profundas consequências para a política francesa e para o projeto europeu.
Nos últimos anos, Le Pen moderou algumas das suas posições a respeito da pertença ao euro e à União Europeia (UE), mas tudo leva a crer que tentará fazer aquilo que o “Político” descreveu, recentemente, como o “desmantelamendo por dentro.” A fazer fé nas promessas eleitorais, uma França liderada por Marine Le Pen tentará utilizar o Conselho Europeu - que poderá vir a ser liderado pelo português António Costa – para reduzir o poder da Comissão, em concertação com outros governos de extrema-direita, nacionalistas ou populistas, com vista a criar uma ”Europa das Nações” (expressão “roubada” a De Gaulle), que ninguém sabe o que seria realmente.
Entre outras coisas, o partido de Le Pen quer favorecer as empresas francesas ao arrepio das regras comunitárias, colocar em causa a livre circulação, acabar com a área Schengen, deportar os imigrantes ilegais e retirar-lhes direitos e apoios sociais, reduzir o contributo francês para o orçamento da União e eliminar a Política Agrícola Comum. Marine Le Pen pretende ainda que a França saia da NATO e da “esfera de influência americana” e chegar a um entendimento com a Rússia, sendo de esperar que reveja o apoio que o país tem dado à Ucrânia.
A seu favor, Le Pen tem o peso económico e demográfico da França no seio da União (que lhe dá alguma margem em Bruxelas), bem como o desconhecimento que a maioria dos franceses tem em relação às regras comunitárias. À semelhança do que fizeram os defensores do Brexit, as promessas de Le Pen sobre a Europa são apresentadas de forma vaga, sem referir as reais consequências de um braço de ferro com Bruxelas, de um “Frexit” ou da saída do euro. É que, mesmo com um rebranding e auma “normalização”, algumas formas de agir fazem parte do ADN do populismo e não se conseguem simplesmente apagar.